Ser advogado é...Fazer do Direito o maior lazer; da justiça o maior lema!

domingo, 7 de novembro de 2010

. Rita Martinatto Gay*

RESUMO
O presente artigo, tendo como tema central a polêmica sobre o sistema penal brasileiro, visa enfocar a necessidade que existe de criação de novas leis; necessidade que o nosso Código Penal seja refeito com normas que se adaptem a nossa atualidade e que o Estado, necessariamente, supere os desequilibrios econômicos-sociais, para que não tenhamos um sistema penal apenas punitivo mas, sim, preventivo.
Palavras chave: políticas sociais, prevenção, ressocialização, criminalidade .


O Direito transforma a realidade e é transformado por ela. Nosso Sistema Penal se encontra em desarmonia com a Carta Magna; impossível não ver o óbvio, uma vez que a  Constituição é datada de 1988 e o Código Penal de 1940, momentos políticos completamente diversos. Existem também leis que se mantêm nos livros e passam a não ter validade sociológica.
O jurista Miguel Reale Júnior se posiciona afirmando que o fundamental é reformular o sistema de penas, que em vezes apresenta-se extremamente rigoroso e em outras muito benevolente, a exemplo das penas  de multa que podem representar a impunidade para aqueles que tem poder aquisitivo mais elevado.  Onde fica então a afirmação de que todos são iguais perante a lei? Torna-se uma grande mentira? Como podem ser todos iguais se os destinatários da lei estão em situações econômico-sociais tão diferentes!
Pensemos então em Aristóteles quando dizia que igualdade consiste também em tratar os desiguais desigualmente. Esta afirmativa nos reporta ao atual sistema brasileiro, onde não existe uma única lei, mas diversas leis e algumas delas específicas para determinadas pessoas, excluindo outras. Como falarmos em princípio da isonomia  se verificamos que a lei é aplicada sem hesitação aos desfavorecidos e quando se trata de indivíduos ligados às classes de maior poder ocorre desconforto em aplicá-la.
Concordamos que o Direito deve se adequar às novas exigências sociais e que uma boa legislação é capaz de promover mudanças, porém nosso Código Penal sofreu alterações aqui e ali e está retalhado. Embora nossa legislação Penal tenha sistematizado muito bem as principais regras que regem todos os crimes, o que se vê são novas leis criando exceções a essas leis, de maneira que o hoje não se pode dizer que temos um sistema penal no Brasil; a legislação criminal tornou-se um somatório de leis, algumas vezes disciplinadoras da mesma coisa, sem possuir coerência entre si, pois, quanto mais leis existem, mais elas se anulam.
Não podemos entender a norma penal como centro do Direito Penal, ignorando a realidade que nos rodeia. O Estado vem procurando solucionar os problemas sociais por meio da criação descomedida de normas penais, que conflitam com questões não solvidas e que são objetos de discução nos dias atuais por serem insuficientes a resolução destes problemas em sua origem. Os legisladores têm se inclinado sobre o ordenamento jurídico penal com furor no intuito de promover mudanças, na busca de aplacar os ânimos da sociedade com promulgação de leis localizadas, que não surtirão efeito e servem apenas de paliativo; alterações quase sempre repressivas que exarcebam o poder punitivo do Estado sem, contudo, resolver o maior problema que são a desigualdade econômica e social, principais origens da criminalidade. Propostas enganosas e errôneas, totalmente contrárias a um Estado Democrático de Direito, que acobertam a própria inoperância do Estado.
A insensatez está em vermos que as penas tem efeito apenas nos marginalizados, frutos de uma sociedade individualista, competitiva e altamente capitalista. Uma punição equivocada e ineficaz quanto ao papel de prevenção que cabe ao Estado. O que vimos são normas que não são temidas pois não evitam novas ocorrências de crimes, a exemplo das penas privativas de liberdade, que demonstram o poder punitivo do Estado, e que atualmente encontram-se distante de sua finalidade ressocializadora. Notório o aumento da população carcerária, a falta de perspectiva do condenado em relação ao seu futuro, produzindo efeitos devastadores de personaidade, disseminação das facções criminosas e nenhuma diminuição no número de delitos praticados.
Não podemos pensar isoladamente em políticas penitenciárias e políticas criminais. A modificação deve vir acompanhada de uma mudança social para que não deixemos que nosso país se preocupe excessivamente em punir as condutas criminosas, mas também em não deixá-las acontecer. Não basta privar os criminosos de sua liberdade, mas criar condições para que os potenciais criminosos possam ter oportunidades para seguir outra trilha que não a da criminalidade. A mudança social deve começar por cada um de nós; não nos deixemos abarcar pela opinião pública, manipulada por uma elite dominante. Vamos lutar contra a impunidade, buscar uma maior cooperação e integração entre polícia militar, polícia civil, Ministério Público e Poder Judiciário. Busquemos maior agilização no encerramento dos processos, redução no excesso de recursos, rever o foro privilegiado, permitir que o Ministério Público, titular da ação penal, possa investigar de forma exclusiva quando a investigação criminal não for suficiente, buscando os elementos necessários para sua atuação. Não vamos mais aplaudir discursos baseados em promessas!
Cobremos dos políticos uma atuação do Estado mais expressivas em políticas sociais. Para refrear a criminalidade e termos um sistema penal eficiente não é necessário a criação de novas leis; é necessário que nosso Código Penal seja refeito com normas que se adaptem a nossa atualidade e que o Estado, necessariamente, supere os desequilibrios econômicos-sociais, pois o principal objetivo de um sistema penal não deve ser apenas punir os criminosos, mas, sim, proteger a sociedade.


ORIENTADOR:
Dr. Márcio Schlee Gomes
Graduado em direito pela Universidade Federal de Pelotas (1995). Professor de graduação da faculdade Anhanguera/Atlântico Sul - Rio Grande e Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, 1ª Promotoria de Justiça Criminal.

FONTES BIBLIOGRÁFICAS:

BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos Delitos e das Penas. Tradução: Vicente Sabino Junior. São Paulo. Ed única. CD, 2002.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir; nascimento da prisão. Tradução: Raquel Ramalhete. PETRÓPOLIS. Vozes, 1987.

BATISTA, Nilo. Matrizes Ibéricas do Sistema Penal Brasileiro. São Paulo. Revan. Ed 2, 2005.

JUNIOR, João Marcello de Araújo. Sistema Penal para o Terceiro Milênio. São Paulo. Reva. Ed1, 2007.

ZAFFARONI, Eugenio Raul; BATISTA, Nilo. Direito Penal Brasileiro. São Paulo. Revan. v. I, 2006.


*    Acadêmica de Direito - Turma B – 8º semestre Noturno – Anhanguera/Faculdade Atlântico Sul – Rio Grande